‘Meu nome é Laura’, de Alex Andrade: entre a delicadeza e a brutalidade do cotidiano

Um garoto faz descobertas sobre si. A mãe reage com crueldade. Os colegas da escola partem para a agressão. Os avós recorrem ao moralismo religioso. O pai tenta proteger a criança e ajudá-la a enfrentar um mundo bastante hostil. Essa dinâmica repleta de movimento, trauma e violência norteia Meu nome é Laura, novo romance de Alex Andrade, publicado pela Confraria do Vento.

‘Açougueira’, de Marina Monteiro: pensamentos afiados e vozes acusatórias

Não é exagero dizer que entre as muitas leituras que fiz em 2024, Açougueira, romance de estreia de Marina Monteiro, está entre as mais impactantes. E não digo isso apenas pelo enredo, mas, sobretudo, pela linguagem.
Poucas vezes me deparei com uma obra literária capaz de trabalhar as especificidades das vozes de cada personagem como acontece com o livro publicado pela Claraboia. A começar pela protagonista. Suas falas e seus pensamentos são diretos. Afiados. Precisos. Não abrem espaço para o que é prolixo ou desnecessário. Cada palavra está em seu devido lugar. E diz a que veio. Assim como a personagem.

Ronaldo Correia de Brito: ‘O povo brasileiro é múltiplo, não apenas dual’

Foi com Retratos imorais (2010) o meu primeiro contato com a literatura de Ronaldo Correia de Brito. Li aqueles contos sobre pessoas despedaçadas como se conhecesse cada uma das personagens. De lá pra cá, devo ter voltada à obra por diversas vezes e me aventurado por outros grandes livros do autor, como Galileia (vencedor do Prêmio São Paulo de Literatura) e Dora sem véu. Cada leitura proporcionou uma experiência diferente, mas todas igualmente marcantes. Não por acaso, Alberto Mussa se referiu a Ronaldo Correia de Brito como “uma presença indispensável na biblioteca brasileira”.

Em 2024, seu novo romance, Rio sangue (Alfaguara), tem chamado a atenção de leitores e da crítica especializada, ao apresentar um enredo em que lendas e acontecimentos históricos dividem o mesmo espaço.

‘Breve ato de descascar laranjas’, de Bianca Monteiro Garcia: o desamparo, o luto e a violência

Duas mortes na família. O silêncio que acompanha cada perda. A internação em um hospital psiquiátrico. A tentativa de silenciamento. A luta da memória para resistir e seguir em frente, apesar de.
Breve ato de descascar laranjas (Macabéa Edições e 7letras), de Bianca Monteiro Garcia, toca em muitas feridas. Faz isso de forma intimista e original, mas distante das tentativas de suavizar ou romantizar o sofrimento. Cada uma das quatro partes do livro, que acaba de vencer o Prêmio Jabuti na categoria “Estreante – Poesia”, diz rapidamente a que veio.

Maus presságios - Rascunho

Considerado um dos principais nomes da literatura latino-americana contemporânea, o cubano Leonardo Padura, 69 anos, esteve novamente no Brasil em setembro, cinco anos após a sua última visita ao país, por conta da divulgação de Pessoas decentes, seu mais recente romance.A obra traz de volta o célebre detetive Mario Conde e tem como plano de fundo alguns acontecimentos marcantes para a história recente de Cuba, como a visita de Barack Obama e o show dos Rolling Stones.

Realidade e sobrenatural assustam na mesma proporção em ‘O dia escuro’

Nos últimos anos, o terror tem recebido olhares renovados de artistas que se propõem a mergulhar nas nuances daquilo que assusta e causa desconforto. Não por acaso, a produtora A24 – responsável por filmes como A Bruxa (Robert Eggers) e Hereditário (Ari Aster) – passou de cult a mainstream, ao passo que o cineasta Jordan Peele se consagrou como um dos nomes mais criativos da indústria, ao dirigir Corra, Nós e Não! Não olhe!.

‘Triste cuíca’, de Julia Wähman: a linguagem na construção de memórias

O papel da linguagem na construção das memórias é o principal tema de Triste cuíca, novo romance de Julia Wähman, recém-publicado pela Janela + Mapa Lab. A narrativa fragmentada tem como personagem central uma mulher que encontra nos próprios diários de infância e nos diários de grandes nomes da literatura, um pouco de afeto e uma dúzia de provocações, ao mesmo tempo em que lida com um período bastante nebuloso: a pandemia de Covid.

A violência e o abandono em ‘Minha cabeça dói’, de Alê Motta

Minha cabeça dói, romance de estreia da escritora Alê Motta, já convence no primeiro parágrafo. Afinal, como não prosseguir com enorme curiosidade uma narrativa que começa com “Meu pai me levou para passear naquele carro velho uma única vez, e me abandonou, com o rosto encravado nas ferragens, depois que capotamos. Não esqueço a dor e o cheiro da bebida. Eu tinha onze anos, hoje tenho dezessete”?

“A face mais doce do azar”, de Vera Saad: desilusões no Brasil de Collor - São Paulo Review

Os traumas provocados pelo confisco de poupança no governo Collor aterrorizaram brasileiros e brasileiras por anos. Na verdade, continuam a aterrorizar. Também por isso, essa história merecia ganhar as páginas de um livro de ficção que fizesse jus a todas as camadas dos acontecimentos que marcaram o período de redemocratização do país.  E recentemente, esse livro veio.

Bangue-bangue à brasileira - Rascunho

A cidade fictícia onde se passa Jenipapo western, novo romance de Tito Leite, está longe de ser distópica. Sua dinâmica de funcionamento é a mesma de muitos municípios interioranos espalhados por todo o país: há fome, desigualdade e uma figura poderosa disposta a aniquilar qualquer um que ouse questionar sua autoridade.Em Jenipapo, o trabalho pesado é o que ocupa os corpos e as mentes de boa parte da população.

Carlos Eduardo Pereira: ‘na criação de uma narrativa ficcional, às vezes a gente se esquece de que o narrador é personagem’

O entrevistado dessa semana no especial do Le Monde Diplomatique em comemoração ao Dia Nacional do Escritor (25 de julho) é o carioca Carlos Eduardo Pereira, autor dos romances “Enquanto os dentes” (2017) – livro finalista do Prêmio São Paulo de Literatura – e “Agora agora” (2022), ambos publicados pela Todavia.

Com linguagem cortante, longe de rodeios ou meias-palavras, o autor discute temas sociais e apresenta personagens assombrados por traumas e violências cotidianas. Não por acaso, quando questionado sobre o que move sua escrita responde: “os grilos que me enchem a cabeça e que procuro exorcizar jogando tudo para uma tela de computador.”

Ao longo da entrevista, Carlos Eduardo Pereira ainda falou sobre seus dois livros, sua preocupação com a construção de narradores, as violências recorrentes em ambientes militares, o atual cenário literário brasileiro, entre outros temas.

Cidinha da Silva: “a minha poética bebe das águas das ancestralidades, orixalidades e africanidades”

Em 25 de julho, é comemorado o Dia Nacional do Escritor, data escolhida por conta da realização do 1º Festival do Escritor Brasileiro, promovido pela União Brasileira de Escritores (UBE), em 1960.

Para marcar a data e fomentar o debate em torno do atual cenário literário nacional, o Le Monde Diplomatique Brasil traz, ao longo de todo o mês, uma série de entrevistas com grandes nomes da literatura brasileira contemporânea.

A primeira entrevistada é a mineira Cidinha da Silva, vencedora do Prêmio da Biblioteca Nacional e autora de obras traduzidas para idiomas como o alemão, catalão, espanhol, francês, inglês e italiano. Ao longo da conversa, ela abordou temas como as ancestralidades, o mercado editorial, os recentes casos de censura a livros no Brasil e a literatura como instrumento de transformação social.

‘Livro sem nome’, de Paulo Henrique Passos: a linguagem como matéria-prima

Ainda que algumas obras chamem a atenção por conta de seus enredos mirabolantes, a matéria-prima da literatura continua a ser a linguagem. Essa constatação parece óbvia, mas construir um texto que se preocupa com cada palavra escolhida e que está disposto a fugir do lugar-comum no que diz respeito à narração não é tarefa fácil.

O escritor Paulo Henrique Passos certamente sabe isso muito bem, já que seu romance de estreia, “Livro sem nome”, é um ótimo exemplo de técnica, inovação e sensibilidade.
Carregar Mais